arquivo

Arquivo mensal: setembro 2012

Há setenta anos nascia no Rio de Janeiro, Sebastião Rodrigues Maia, Tim, o soulmen com marca Brasil, o cara que cruzou uma densa fronteira do gosto, que é da cepa de poucos, desses poucos que cruzam a fronteira de classes, que habita as casas da  periferia, que rola no baile dos bacanas, Tim Maia.

Falar de Tim Maia é esbarrar nas suas histórias folclóricas, nas suas gags contra o mundo. Tim deveria rir secreto das suas próprias presepadas, mas segundo o que os próximos relatam queria ser mesmo é querido, e foi, muito. Um dia me disseram (um músico que tocou com ele) que os músicos fugiam de Tim, mas que todos o ouviam com reverência. Tim cantava e isso não era uma metáfora.

Desde menino ouvia Tim Maia, e menino mesmo pude perceber no rosto das pessoas, o brilho, a felicidade, a paixão, quando ouviam as canções do doidão. Aquela figura enorme no Chacrinha, nos vários programas de TV, na rádio, e nos ecos da vida suburbana, foram formando meu juízo de Tim, e ele foi foi me formando, a música, as lembranças, os momentos de firmar, de pensar e de esquecer. A música que nos imprime.

Uma imagem marcante era dormir tarde nas noites de sábado, tinha um clube perto de casa, noite de baile, lá pelas onze e pouco, meia noite, ouvia lá no fim da rua a música alta, black music, soul, Tim Maia, vozeirão, aquilo enchia a noite curta do menino sonhador que tinha que dormir cedo, burlava porque era sábado. Tim Maia trilhava a beleza do meu sábado.

Os hits das rádios, Primavera, Azul da Cor do Amor, Cristina, Você, Réu Confesso, Lamento, Coroné Antonio Bento, a jukebox Seroma que se formou em quatro décadas. Tim se misturava aos cantores populares das rádios AM, não ficava estranho ali, era daquele lugar, de todo lugar, era um cantor popular, com cancha, com ginga, com músicas em tom menor, balanços, que enchiam os romances de pessoas independente de onde elas saiam e onde estavam. Dançavam e viviam seus amores, e isso permaneceu.

Acredito que muitos poderiam escrever a “sua história” de Sebastião Rodrigues Maia, contada com músicas e com o enredo das melodias, coincidências e inspirações, amores, desamores. A força do compositor/cantor que superou barreiras, drama que ele exacerbava, mas que sabia que foi duro superar. Tim lutou muito contra a maré e criou muita maré contra, brilhante contraditório.

Torcedor do América, gordo, inconsequente, cheio dos rompantes, Tim Mais não distribuia rosas, deixa esta tarefa para suas canções, foi e voltou várias vezes, deu entrevistas polêmicas, outras desastrosas, criou frases antológicas, um rebelde de verdade que não emulava rebeldia. Pagou preço alto.

E foi num domingo, disso lembro bem, eu tava navegando à toa pela web, 15 de março de 1998, pipocava por músicas, notícias, portais, e abrupta manchete estalou na tela: “Morreu Sebastião Rodrigues Maia”.

Voltou tudo na lembrança, os tais sorrisos e brilhos no rosto das pessoas, o clube do barulho belo que reinava nas minhas noites de sábado, o tempo de ouvir rádio, os programas de tv, ele com suas roupas grandes e brilhantes,  as passagens da minha vida que o Tim habitou, a minha história de Tim Maia. Imagens e sons.

Fica a história que ninguém nos rouba, as músicas que mantém acesas as ligações, e não foram poucas, escolher uma é difícil, mas a camaradagem prevalece, e Tim gostava de incensá-la em suas canções. Escolhi Compadre, porque Tim foi do seu jeito e do meu jeito, um compadre na minha vida.

Marta Suplicy, a nova Ministra da Cultura.

A Cultura muda de mãos. O que se espera é que a concepção seja repensada, que o conceito de cultura se amplie e reflita nas ações do Ministério. Que volte a política para a cultura. Logo dirão (já disseram) que nada mudará, pois a tão esperada mudança foi apenas um movimento político. Apenas?  Isso já é um debate, que o debate e o conceito se ampliem. De Ana para Marta.

Marta veio de uma experiência no Ministério do Turismo não tão triunfante, mas o contexto enche a sua indicação de esperança. A gestão de Marta na Prefeitura de SP teve boas iniciativas. Mas, esperança não é o bastante para a Cultura neste momento, a Cultura precisa de política, ainda que demonizem a política.

Ana de Holanda decepcionou desde o seu discurso de posse. Menos por imperícia, do que por compromisso. Os compromissos eram claros. E foram ficando cada vez mais claros com dos desdobramentos da gestão. Instalou-se um debate polarizado: de um lado os os defensores dos avanços da gestão Gil/Juca e de outro os defensores da zona cinzenta.

Zona cinzenta que não define o quê, mas zona tão clara para atingir seus objetivos. Zona cinzenta que despolitiza. Zona cinzenta que fez política cultural dar passos para trás.

Ana de Holanda é apenas um nome que representa a cultura do século vinte, de um momento específico do século vinte, a década de 70. Para garantir o direito do autor, do conteúdo, menos do artista, mas da industria. Obsoleto. Nada tira a certeza de que foi um acordo pensado. Ana apenas fez seu papel.

O corolário de mancadas e declarações estapafúrdias foram o grifo pessoal da irmã do “Vai Passar”. Ana passou. Dilma não se manifestou nunca de forma clara. As colunas da cultura se indignaram. Mesmo os defensores do estado mínimo reclamavam da imperícia no Ministério. Despolitizador.

As mulheres no protagonismo. Vão e vem. Chega Marta. Ana vai, quase aliviada.

Claro que quem reclamava apenas para apontar as “fraquezas” do Governo Lulodilmista, continua reclamando. A política de novo. Apesar de negarem um debate político.

Marta, segundo os hermeneutas, recebeu o MINC num toma lá da cá para compensar a perda da candidatura à prefeitura de SP. Fisiologismo acusado num caso onde o partido que esta no poder dá um cargo a um parlamentar do próprio partido. O jornalismo militante é criativo, cria conceitos absurdos, surrealistas.

Marta assume o MINC com promessa de orçamento polpudo para o próximo ano. Vamos aguardar. Mas ainda falta a política. É a política cultural que esperamos.

Que Marta ouça as vozes caladas, que reacenda as conferencias temáticas e regionais, que volte à lógica pública e a inversão de sinais de prioridade, que coloque a Lei Rouanet na berlinda, e repense a relação entre cultura e propriedade que a transforma em caduca. Nada de negar propriedade, mas de perceber as propriedades que a Cultura contém. Política cultural.

Tirar a cultura dos currais é desafio de qualquer Ministro. E Ministra:

Não ceda (facilmente) a lobbies pretensamente “simpáticos” e os já conhecidos “antipáticos”.

Cultura não é simpatia, não é antipatia. “Cultura é a prova dos nove.”

As mulheres no poder, Ana no passado, Marta no presente, Dilma, tomara, no futuro.

O debate esta aberto. Política na política cultural.