Abandonei o futebol. Os motivos são óbvios. A humilhação dos 7×1 (corroborada na Copa América), a decadência da Lusa, meu time do coração que luta para se manter na série c do brasileiro, e a coxinhice dos estádios de futebol, são motivos maiúsculos pra que eu retire o futebol da minha vida.
Mas o futebol está comigo em lugares escondidos, às vezes ele me encontra, às vezes eu esbarro nele por aí.
Duas imagens me trouxeram o futebol à vida na última semana.
De alguma maneira a fotografia do menino José Carlos Vilella Jr apareceu na retina. O registro do choro feito no final da derrota brasileira para a seleção italiana, em cinco de julho de 1982, publicada no Jornal da Tarde, estava carregado de tristeza e frustração de um lado e de muita esperança de outro.
O Brasil dirigido por Telê Santanna, na Copa de 1982, trazia muitas diferenças do Brasil dirigido pelo capitão do exército Claudio Coutinho em 1978, existia uma mudança de fato.
Desconstruíamos a ditadura, o Brasil em campo era parte da leveza da abertura, com Socrates da democracia corintiana, com outros menos engajados, mas que encantavam nosso jeito amador de entender o futebol e de esperar por dias melhores.
O Brasil reaprendia a ser livre, sorrir e ter esperança. Havia complexidade no choro do menino do Sarriá. Acho que não foi à toa que eu virei as páginas de um livro velho e me deparei com essa foto.
A outra imagem que me remeteu à leveza que pode ter o futebol foi a alegria dos torcedores islandeses depois da histórica vitória contra a Inglaterra na Copa da UEFA. Eu não vi o jogo, nem mesmo os gols, só as fotos. Serviu.
Até então a Islandia não existia para o futebol. Assim como até 2008 a Islandia era o país da cantora Bjork e do gelo, quando surgiu nas manchetes de jornal como exemplo da quebradeira promovida por seu presidente Geir Haard, um fundamentalista neoliberal, agora execrado e enterrado na historia islandesa.
O Brasil esperançoso de 1982 andou, reconstruiu a democracia, teve eleições diretas em 1989, depois dela mais seis. Ironicamente após o 7 x 1 contra a Alemanha, vive um vergonhoso processo de interrupção da democracia. Michel Temer é o sete gols tomados na política, para o país é essa a maior derrota.
A Islandia construiu coletivamente um caminho para recuperar a esperança roubada pela sanha neoliberal. Na política o povo islandês inventou uma saída pela autodeterminação, reforçada pela recente eleição do historiador Gudni Jóhannesson. Portanto, o gol de Sigthórsson na virada contra a Inglaterra não foi um ato isolado.
Não, o futebol não opera milagres, nem revela nada que não esteja explicito nos rostos, nas ruas, nas vidas das pessoas. O futebol não define povo nenhum, no máximo ele reflete as coisas do mundo e é ai que ele sobrevive, preserva alguma verdade e poesia.