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Arquivo mensal: julho 2016

Meu tio Lincoln tinha um bar perto da minha casa. Eu tinha cinco anos e morava na Avenida Kennedy em São Bernardo do Campo. 

Foram poucas vezes que eu fui lá, mas é nítida a imagem dele atendendo com o cigarro na boca, servindo doses de bebidas fortes. Eu achava meu tio bem velho e ele tinha pouco mais de quarenta anos. Suas roupas, atitudes, o jeito de lidar com as pessoas. 

Quando penso no tempo, lembro da imagem do meu tio no balcão daquele bar, a luz fraca, os clientes folclóricos. Para mim meu tio já estava há muito tempo no mundo e aquele bar era o lugar de observar, de refletir. 

Passei a vida pensando que quando chegasse aos 40 anos seria velho e teria um balcão pra contemplar o mundo. Tive vários balcões na vida, trabalhei em loja de discos, livraria, me formei bibliotecário e tive inúmeros balcões para olhar a vida pelos livros e leitores. 

Privilégio, não precisei esperar tanto tempo. 

Ontem, amanheci com meio século. Quarenta e cinco anos depois aquele menino que admirava a maestria do tio ao fazer coqueteis populares de cachaça e outras misturas, mudou o olhar sobre o tempo. 

Hoje, já não tenho balcão para me separar e proteger da vida dos outros. O balcão se diluiu ao tempo que passou e deu espaço para outras fronteiras.

No tempo que ainda vem, espero poder olhar atento às coisas do mundo, descobrir e desfazer novos balcões. E que esse tempo seja leve e que o velho sempre esteja longe, até o dia que perder todo o sentido.